A África do Sul pós-Apartheid
- circulareslivros
- 10 de jul. de 2021
- 3 min de leitura
Atualizado: 13 de jul. de 2021

O regime de segregação racial da África do Sul, o famigerado Apartheid, foi extinto em 1991. Foram mais de 4 décadas de violência e discriminaçao institucionalizada por um sistema legal e político que retirou da população negra todos os direitos. Mais de 3 milhões de pessoas, comunidades inteiras, foram forçadas a se mudar para áreas destinadas aos negros, privadas de infraestrutura e de serviços públicos, expostas a todo tipo de violência, em estado de miséria. Os negros eram 80% de toda população do país, mas ocupavam apenas 10% do território. Precisavam de autorização para transitar nas zonas exclusivas para brancos. Nessa epóca, o casamento entre pessoas de raças diferentes era ilegal.
Em um esforço de reparação dos danos vivenciados e de construção de uma memória coletiva, todo o horror desse período está registrado no cotidiano das pessoas e das principais cidades sul africanas. São monumentos, museus, prédios, documentos e datas que marcam as histórias dos personagens que sofreram ou perpetraram crimes.
Com o fim do Apartheid e a eleição de Nelson Mandela para a presidência da África do Sul, em 1994, nasce o sonho da nação arco-íris, marcada pela inclusão e diversidade cultural. Mandela deixou bem claro que sua intenção não era criar outro regime segregacionista, separando a minoria branca da maioria negra. A ideia era proporcionar uma sociedade igualitária, independente do credo, religião e cor.
Os anos seguintes foram marcados pela esperança e otimismo de que todo o potencial do país desabrocharia, com democracia e justiça social. Trinta anos, entretanto, não foram suficientes para diminuir o fosso social e econômico entre brancos e negros. A expectativa de uma grande transformação social em um período tão curto dificilmente seria possível. A África do Sul tem índices de pobreza, desigualdade, desemprego e corrupção alarmantes, mas que incidem de forma diferente entre os segmentos da população, afetando fortemente os negros. Os territórios continuam bem demarcados. As zonas mais desenvolvidas e prósperas são ocupadas majoritariamente pelos brancos, enquanto os negros continuam nas periferias. As “cidades de lata” se espalham ao redor dos centros urbanizados. É comum ver grupos de negros em busca de bicos nas portas dos condominios fechados onde moram os brancos. De certa forma, a segregação continua presente no país.
Ao mesmo tempo em que a África do Sul passou a receber um grande fluxo de imigrantes de outros países africanos, a falta de oportunidades e concorrência por postos de emprego trouxe um sentimento de xenofobia e tensão entre os estrangeiros e à comunidade negra local. Entre os brancos, há um forte êxodo para países como Austrália, Nova Zelândia e Inglaterra. Alegam que a política de cotas os exclui de oportunidades e partem em busca de melhores perspectivas no exterior.
A corrupção também assola o ambiente político do país. O partido de Mandela, o Congresso Nacional Africano (CNA), está no poder desde as primeiras eleições livres em 1994. Diversos dirigentes do partido, que comandaram a luta contra o Apartheid, foram envolvidos em casos de lavagem de dinheiro, fraude e favorecimento de contratos. O ex-presidente Jacob Zuma renunciou do cargo em 2018 e responde a 800 denúncias de corrupção.
É esse o pano de fundo do romance “O melhor tempo é o presente”, da sul africana Nadime Gordimer. Ganhadora do Prêmio Nobel em 1991, é também conhecida pelo seu engajamento político na luta contra o regime segregacionista do seu país. Vale dizer que, como Nadime, muitos brancos denunciaram e atuaram contra o Apartheid. Vivia em Joanesburgo e tomava café da manhã todo mês com Nelson Mandela. Esteve no Brasil em 2004, participando da FLIP. Morreu aos 90 anos, em 2014.
A @circulares possui outros livros de Nadime Gordimer:
O engate
De volta à vida
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